quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Cidade corrompida

Foi em agosto de1852, por iniciativa de Antônio Saraiva, então presidente da província do Piauí, que se decidiu transferir de Oeiras para Teresina - o nome é uma homenagem a imperatriz do Brasil Teresa Cristina, esposa de D. Pedro II - a sede da capital piauiense. Atualmente, os ilustres envolvidos na criação da nova capital são título de diversas obras públicas. Entretanto, para muitos, Saraiva, não passa de uma praça antiga localizada no centro da cidade. Ponto noturno de mendigos, usuários de drogas e prostitutas. O descaso para com a memória é algo corriqueiro no cotidiano de Teresina. Bastam quinze minutos de caminhada pelo centro da cidade para que se perceba tal fato.
A maioria dos prédios históricos de Teresina está em decadência, prestes a cair sobre a cabeça de qualquer transeunte desatento. E boa parte das antigas construções que conseguiram manter-se sem grandes danos perante as tiranias do homem e do tempo ainda é obrigada a suportar, em sua fachada, latadas de metal e plástico que propagandeiam lojas e outros estabelecimentos comerciais. Uma arquitetura completamente desfigurada. Isso quando escapam à demolição. Não é raro ver, nos bairros centrais da capital, casarões e sobrados dando lugar a estacionamentos rotativos ou depósitos de bebidas. Defender essas construções não se trata de saudosismo: “a memória é uma das formas com as quais o homem trava conhecimento com as coisas do mundo”. Além disso, esses casarões históricos carregam consigo vários mistérios e signos a serem decifrados.
A Teresina com ares de aldeia, descrita por H. Dobal em suas crônicas, agora é uma lembrança antiga na recordação dos habitantes mais velhos da cidade. O crescimento populacional na Chapada do Corisco foi imenso, mas, paradoxalmente, o contato entre os indivíduos se tornou cada vez mais exíguo e superficial: “ossos do progresso”, as árvores também sabem perfeitamente desses dissabores que a modernização dos tempos traz. Teresina parece não querer honrar com a antonomásia de “cidade verde”. Todos os dias, especialmente no perímetro urbano da capital, árvores caem impotentes perante a fúria de machados e motosserras. Em seus lugares, condomínios de luxo, supermercados ou, simplesmente, uma calçada de concreto. “A raiz faz rachar todo o cimento”, alega a dona de casa exigente.

Completando agora 158 anos de idade, Teresina ainda guarda muito do seu provincianismo. Mas essa cidade localizada entre rios no sertão do Piauí possui tímidas ambições à metrópole. E nesse contexto, o desafio é crescer sem que se perca a essência, a identidade.

Lucas Coelho - diretor do CACS - UFPI

2 comentários:

  1. Parabéns razão do meu orgulho, do orhulho de toda família, de toda Teresina a quem voce prestou essa homenagem.... Parabéns mesmo! um abraço - FILIPE COELHO

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  2. Legal Lucas, a indignação, revolta e denuncia que o texto expõe apontando para um dos grandes problemas que enfrentamos: a identidade cultural do Piauí, que parece se perder a medida que o mundo aproxima-se de nossa história, essa urbanização desenfreada parece querer engolir uma tradição, e parece não existir resistência para barrar essa destruição histórica.Nossa cidade, a que amo cada fragmento, a que me forja é a que quero que cresça e mantenha suas raízes firmes, afinal 158 anos de mocidade , de juventude e de uma beleza específica merece todo nosso carinho.Não seremos tolos de mutilar os olhos diante da verdade, uma verdade corrosiva, a da desigualdade que nos cerca, a dos desafios que temos que enfrentar para conseguir poder ,de fato, comemorar, e poder dizer que estamos entre os melhores.Mas no poente, no termino do caloroso dia, vemos o sol dourado mergulhando no horizonte e nas águas do Parnaíba, lembrando toda sua beleza e potencialidade! abraço Lucas!

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